Trabalho, escola, lazer e outras atividades vieram para dentro de casa e exigiram adaptações para toda a família no último ano
A ideia de trabalhar em casa, com horários flexíveis e rotina adaptável, já se apresentava como uma tendência adotada por muitas empresas modernas e disruptivas. Contudo, o que muitos profissionais não esperavam é que com a pandemia isso se tornaria realidade, do dia para a noite, em grande parte das organizações. Há pouco mais de um ano, o home office era apenas uma medida temporária e provisória. No decorrer dos meses, enquanto muitas empresas passaram a enxergar os benefícios deste modelo, o cenário que parecia ideal para os profissionais, se tornou motivo de muito estresse, esgotamento físico e mental.
O mesmo fato se repetiu dentro das escolas: as crianças precisaram ir às pressas para casa e os pais tiveram que criar uma nova rotina que inclui o modelo de ensino online, o trabalho remoto e, ainda, conciliar tantas outras atividades e responsabilidades. Segundo a psicóloga do Hospital Santa Cruz, Jenima Prestes, a pandemia fez com que várias adaptações surgissem ao mesmo tempo, tornando o processo ainda mais difícil. “Muitas atividades ficaram acumuladas com a pandemia e precisaram ser repensadas, como a escola das crianças, o momento de lazer, as tarefas domésticas. Estar no mesmo ambiente, neste caso dentro de casa e com essa sobrecarga, pode aflorar conflitos e despertar sintomas como ansiedade, por exemplo”, ressalta a psicóloga.
Para Gisele Fabris Viensci, mãe de duas crianças, foi complicado ajustar a rotina dos pequenos com as aulas online e também conciliar o trabalho dela como nutricionista, dentro do mesmo ambiente. “Como tenho dois filhos, tive que deixar um em cada ambiente para que não se distraíssem. Aos poucos fomos aperfeiçoando, as crianças se adaptando a nova rotina e entendendo que aquele momento era de estudar. Ao mesmo tempo que acompanhava eles nas aulas e dava suporte, também tinha as minhas responsabilidades do trabalho para entregar”, descreve a mãe.
Sensação de super aproveitamento do tempo
Separar a rotina pessoal da profissional, não fazer as pausas na hora certa e, principalmente, trabalhar mais do que o estipulado e ainda produzir menos, são algumas das consequências que podem ser identificadas pelos profissionais durante o home office. De acordo com Fábio Sanchez, consultor na área de Tecnologia da Informação e que trabalhou por um longo período em casa durante a pandemia, o home office tem muitos benefícios, contudo, estar presencialmente no escritório faz com que a equipe esteja mais motivada, a comunicação seja mais efetiva e os horários fiquem melhor estabelecidos.
“Quando trabalhamos em sistema de home office, não temos aquela sensação de ‘chegar em casa’, sabe? Parece que vivemos dentro do trabalho, pois a casa e o escritório viram a mesma coisa. Sem contar que o conflito com as pessoas que convivemos, como esposa e filhos, aumenta. Além de que, no escritório, temos acesso às informações e aos recursos de forma mais fácil, seja dos mais simples como um mouse extra, uma impressora, até aos materiais de papelarias ou uma cadeira ergométrica”, explica.
A psicóloga do Hospital ainda orienta que é preciso estabelecer uma rotina com espaço e tempo bem demarcados, além de evitar super aproveitar os momentos de pausa para fazer outras atividades, por exemplo. “Às vezes, fazer muitas coisas ao mesmo tempo é um desgaste e não um ganho de tempo. Precisamos dessa sensação de finalização do dia de trabalho, para fazermos outras coisas em casa, assim como precisamos de pequenas pausas apenas para tomar um café e relaxar a cabeça”, recomenda Jenima.
Adaptação no ambiente e as consequências físicas
Uma das maiores discussões em relação às consequências do home office e do homeschooling para as famílias foram os fatores físicos e ambientais. A grande maioria dos profissionais precisou adaptar um escritório em sua casa, sentando em cadeiras inapropriadas e que acabaram, ao longo dos meses, prejudicando a postura e acarretando em problemas de coluna, mão, punho e ombro. Segundo o ortopedista e traumatologista do Hospital Santa Cruz, Dr. José Eloy (CRM-PR 22.020, RQE 56/1.659), que também é especialista em cirurgia da mão, os efeitos do home office começam, primeiramente, com a postura inadequada e a alteração da ergonomia da coluna.
“Muitas vezes, a pessoa está trabalhando à mesa da sala de jantar, sentada em uma cadeira muito baixa, durante muitas horas, contrariando as orientações corretas de ergonomia. Isso altera toda a biomecânica da coluna e membros superiores ocasionando sobrecarga de grupos musculares, desencadeando dor e desconforto. As regiões cervical e lombar da coluna e mãos, punhos, antebraços e ombros são locais comuns de queixa dos pacientes”, exemplifica o médico ortopedista.
As mãos, punhos, antebraços e os braços também precisam estar bem posicionados, explica o médico: “o recomendado é que fique apoiado desde a mão até o cotovelo sobre a mesa ou então em cadeiras com apoios para os cotovelos. Quanto menos apoio a pessoa tem, que é o caso de trabalhar na cama com o computador no colo, por exemplo, mais ela sobrecarrega o punho, mão e antebraço”.
No caso das crianças em aula domiciliar, a coordenadora pedagógica da Colégio Acesso Kids, em Campo Largo, conta que a escola deu todo o suporte e orientação aos pais em como proporcionar um homeschooling tranquilo e confortável para eles. “Conversamos com os pais sobre a importância do aluno ter, dentro de casa, um ambiente que fosse reconhecido como o espaço da escola. As crianças precisavam entender que, naquele momento, a casa deles também seria a escola. Orientamos a prepararem um espaço adaptado à faixa etária da criança, por exemplo, com uma mesinha e cadeira do tamanho adequado, além de retirar desse ambiente estímulos que pudessem distraí-los durante as aulas, como brinquedos e televisões”, relata Luiza Carolina Batista.
Aliviando os efeitos físicos e psicológicos
A prática de exercícios simples e pequenas pausas durante o dia, podem aliviar os efeitos físicos e psicológicos do trabalho e estudo em casa. O médico ortopedista aconselha fazer pausas de 10 a 15 minutos a cada uma hora trabalhada, para alongar o corpo e dar uma caminhada. “Existem exercícios simples de movimentação, agachamento, alongamento com elástico ou com peso que podem ser feitos em casa. São atividades de ginastica laboral que podem ser praticadas ao longo do dia e que aliviam as dores e desconfortos”, explica Dr. José Eloy.
Já a professora de educação física do Colégio Acesso, Vânia Sampaio Sávio, orienta as crianças que estão no ensino remoto a praticarem alongamentos simples, geralmente focados na coluna e que ajudam na postura. “Trabalhamos também exercícios de respiração, que são ótimos para a concentração e acalmam os alunos. Indicamos aos pais, praticar nos momentos em que as crianças estejam mais ansiosas”, conta a professora.
Humberto Schvabe