O senador José Sarney não é apenas imortal da Academia Brasileira de Letras – título duvidoso, aliás – mas parece estar querendo sua eternidade no Congresso Nacional. No dia 1º de fevereiro de 2011 foi inaugurada a nova legislatura do Senado Federal, recheado de alguns novos nomes e dos velhos figurões de sempre. Como novidade política no país do carnaval e da impunidade é algo “tiririqueano”. Como sempre digo, é tautológico.
José Sarney é meio mitológico. Tem certos poderes sobrenaturais. Eu mesmo já experimentei essa “força estranha”. Em outubro de 2010 fui contratado para pelo Conselho Regional de Administração do Estado do Maranhão – CRA/MA – para ministrar uma palestra sobre política brasileira e administração pública para estudantes universitários, professores e profissionais maranhenses. Na ocasião, tive a oportunidade de conhecer a capital, São Luís, e me chocar com o poder feudal. No caminho entre o aeroporto e o hotel onde fiquei hospedado, o motorista, como um guia turístico, foi me apresentando os locais: “aqui é a Avenida José Sarney; essa é a Praça José Sarney; essa aqui é a Ponte José Sarney; e esse aqui é o campus universitário José Sarney... mas aquela ali é Maternidade Marli Sarney e logo depois a Avenida Governadora Roseana Sarney!” Não é só chocante. É absurdo.
Foi ficando cada vez mais claro que era uma ousadia daquele órgão ter me contratado para fazer uma palestra sobre política. Há anos sou crítico público não apenas dos Sarney, mas desse anacrônico coronelismo que ainda insiste dominar alguns feudos brasileiros. Para minha absoluta surpresa o auditório estava superlotado. Preparado para receber cerca de 850 pessoas, havia mais de 1.300 maranhenses naquele espaço, aguardando para ouvir o que eu tinha a lhes dizer. Aliás, rendo aos jovens do Maranhão um dos momentos mais incríveis da minha vida profissional e a prova inconteste de que nem tudo está perdido.
Antes de entrar nos assuntos políticos e de administração atuais, faço um rápido retrospecto da vida política brasileira pós-redemocratização. No exato momento que falei as duas palavrinhas mágicas “José Sarney”, todas as luzes do hotel se apagaram. Em meio a uma salva monumental de palmas, vi toda sala de convenções virar um breu. Alguns minutos depois a luz foi reestabelecida e, novamente sob aplausos e gargalhadas, anunciei que, “por questões de segurança, passaria a me referir ao bigodudo apenas como ‘JS’”. A luz novamente se apagou! Convencionamos não falar mais sobre a figura.
É quase certo – digo quase – que o senador José Sarney nada tem a ver com o corte de energia do fabuloso Rio Poty Hotel, mas não deixa de ser bastante ilustrativo dos “puderes” lendários que o patriarca inspira. No avião, durante a volta ao Rio de Janeiro no dia seguinte, fiquei martelando aquele fato na minha cabeça. E minha conclusão não poderia ser outra: é exatamente essa mágica mitológica, esse psicológico pseudopoder, que mantem a aura intimidadora, meio centauro, meio serpentário, do senador imortal.
Tenho quase certeza que José Sarney será reeleito presidente do Senado Federal. Seja por deferência, seja pelo cagaço que inspira em seus pares. E, pelo visto, não há Aécio Neves ou Pedro Simon que dê jeito nisso. O homem é um coronel e os demais senadores gostam de comportar como suas “rolinhas”. Além do mais, nenhum deles quer arriscar ter suas luzes apagadas.

Helder Câmara
Escritor, Colunista Político, Palestrante e Conferencista

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