A afirmação nacionalista, de forma geral, busca empreender a recuperação de símbolos, experiências e personagens do passado que possam definir a existência de uma identidade comum a uma determinada coletividade. Na Europa, esses movimentos nacionalistas tiveram forte presença ao longo do século XIX, quando vários ideólogos e pensadores se engajaram na construção de um discurso distintivo que pudesse justificar a relevância do incógnito "espírito nacional".
Não se restringindo ao século XIX e muito menos ao Velho Mundo, a ideologia nacionalista ampliou as suas influências para diferentes contextos históricos. Nas primeiras décadas do século XX, a ascensão dos regimes totalitaristas recuperava uma ideia de supremacia e hegemonia que visava arrefecer os conflitos e disputas políticas que, no caso, eram criticados enquanto "contendas menores" que impediriam a chegada de tempos mais prósperos.
Ao chegar a terras brasileiras, o totalitarismo ganhou voz por meio da articulação do movimento integralista, que teve bastante força nos primeiros anos da década de 1930. Ampliando suas preocupações para fora do campo político, os integralistas tinham especial preocupação em varrer todas as influências estrangeiras que ameaçavam a valorização e a preservação de elementos histórico-culturais que, na visão de seus integrantes, definiam traços fundamentais de uma cultura nacional pura.
Tal política cultural acabou se transformando em uma verdadeira "caça às bruxas", contra todo hábito, comemoração ou elemento que pudesse ser visto como um tipo de estrangeirismo. No desenrolar dessa história, até o infeliz do Papai Noel acabou sendo julgado como antinacionalista. Afinal de contas, aquele sujeito gordo, branquelo - com grossa vestimenta - e cercado de renas, pinheiros e neve nada tinha a ver conosco.
Talvez reconhecendo todo o infortúnio que poderiam causar ao defender o banimento do Papai Noel, os integralistas resolveram criar uma espécie de "substituto abrasileirado". Seu nome era "Vovô Índio" e deveria ter a mesmíssima função de alegrar as crianças contado histórias e distribuindo brinquedos, desde que todos eles fossem de procedência genuinamente brasileira.
Para reforçar seu caráter nacional, os integralistas também tiveram o esmero de elaborar uma pequena lenda sobre suas origens. Sendo filho de nossa "democracia racial", o Vovô Índio era filho de um escravo africano com uma índia. Contudo, foi criado por uma família branca que, graças à benevolência de seu irmão, acabou livre da condição de escravo.
Será que o nosso indígena natalino também trocava o famoso "ho-ho-ho" pelo histriônico "anauê!" na hora de convocar nossas crianças?
Humberto Schvabe