É possível perceber como as modificações e aprimoramentos tecnológicos interferem de forma direta na organização da sociedade. A presença de alta conectividade e da digitalização inauguraram o trabalho sob demanda, para entregas de mercadorias, comidas, prestação de serviços e transporte de passageiros, como no caso da empresa de tecnologia Uber, multinacional americana.
Oficialmente, a Uber se auto define como um terceiro que aproxima as duas partes, motorista e passageiro, para viabilizar um negócio jurídico, porém, entende-se que não é mera intermediadora digital do aplicativo, mas sim, empresa do ramo de transportes.
Ao condutor é exigido carteira de habilitação válida, licenças e autorizações aplicáveis para transporte de passageiros, celular para acesso ao aplicativo, entre outras. As despesas com desgaste natural do veículo e combustível são exclusivas do motorista, devendo estar em boas condições de funcionamento e devidamente registrado e licenciado para operar como veículo de transporte, podendo o aplicativo verificar tais exigências de tempos em tempos, inclusive vigiando até mesmo a velocidade do veículo em trabalho.
A taxa de serviço é considerada uma contraprestação da disponibilização da plataforma digital pelo aplicativo, a depender da modalidade escolhida pelo motorista, qualidade do veículo e a cidade onde opera, por meio de um contrato de adesão.
Inicialmente, os trabalhadores uberizados foram colocados à margem da sociedade, sem resguardo de quaisquer condições mínimas de trabalho ou direitos sociais, prevalecendo perante os Tribunais, na grande maioria dos casos, a inexistência de vínculo trabalhista.
Entretanto, com a crise sanitária gerada pela pandemia e necessidade de isolamento, estes trabalhadores ganharam destaque permitindo que as pessoas recebessem mercadorias e serviços com o mínimo contato social.
Com isso, passaram a receber atenção estatal, com a tramitação de projetos de leis que propõe uma nova disciplina para a relação entre as partes. Uma das previsões diz respeito à maneira como deve se dar o descadastramento dos profissionais, pois, quando rescindido o contrato de forma unilateral por parte da empresa, esta não vem assegurando ao trabalhador aviso prévio da desativação e acesso aos seus dados mantidos pela plataforma, ficando o motorista sem entender o motivo pelo qual foi desligado ou teve sua avaliação reduzida.
São inúmeros os processos judiciais entendendo como “indevida” a desativação da conta do motorista de modo infundado, determinando o pagamento de indenizações e restabelecimento do cadastro, vez que a empresa tem o dever de considerar a função social dos contratos, princípio básico das relações pessoais.
Nos parece que a Uber ainda tem muito que aprender e se adequar as normas vigentes em nosso país, principalmente no trato ao motorista/parceiro, a parte vulnerável da relação, quando deveria ser o contrário, afinal, ele é igualmente o trabalhador diário.
Humberto Schvabe